Fábrica de Cultura Jardim São Luís comemora 13 anos

Com trilhas e ateliês, o espaço de acesso gratuito oferece diversas oportunidades de imersão artística para a população local

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   Inaugurada em 2012, a Fábrica de Cultura Jardim São Luís conta atualmente com 1.104 inscritos e oferece ateliês e cerca de 24 trilhas em áreas como música, dança e teatro. As atividades são realizadas ao longo do dia, com horários disponíveis para a manhã, tarde e noite, e atendendo a diferentes faixas etárias. “Antes, tínhamos uma questão de não ter público, mas acredito que isso acontecia porque as pessoas não entendiam o que o espaço oferecia. Fizemos um trabalho de divulgação, tanto nas redes sociais quanto nas escolas e eventos”, explica Brunna Ariely, 28, e Analista Artístico Pedagógico da Fábrica.

Vista da biblioteca da Fábrica de Cultura Jardim São Luís, na zona sul de São Paulo – Foto: Letícia Gomes

  As Fábricas são centros culturais gratuitos criados pelo Governo do Estado de São Paulo em 2011, com o objetivo de promover o acesso à arte nas periferias. Essas unidades fazem parte do programa da Secretaria de Cultura e Economia Criativa e têm como missão democratizar a cultura. Segundo Brunna, entre as atividades mais procuradas, estão a dança, o circo e a música. A unidade do Jardim São Luís conta com um estúdio de gravação de áudio, um laboratório audiovisual e 17 salas. Brunna explica que a biblioteca, aberta ao público, segue um conceito diferente: ‘Ela é uma biblioteca viva, onde o ambiente não é silencioso como nas bibliotecas tradicionais.’ A analista do setor pedagógico também acredita que o público que mais utiliza os serviços desse espaço é o espontâneo, ou seja, aqueles que não estão inscritos, especialmente para utilizar os serviços de impressão oferecidos no mezanino.

   De acordo com o Mapa da Desigualdade 2024, divulgado pela Rede Nossa São Paulo e o Instituto Cidades Sustentáveis, o Jardim São Luís ocupa a 65ª posição no indicador de Cultura, que avalia a presença de equipamentos públicos de cultura na região. O estudo abrange 11 indicadores nos 96 distritos da capital paulista, destacando as desigualdades em diferentes áreas da cidade. “Muitas pessoas que não têm a possibilidade de ir longe para consumir arte acabam consumindo aqui”, relata Victor Hugo Vargas da Silva, 34 anos e aluno de Circo da Fábrica de Cultura da região. Ele explica que a arte no local é consumida com uma qualidade diferente da encontrada em outros espaços artísticos, mas ainda acredita que seu consumo representa um grande avanço.

Alunos da turma de Circo durante a aula na Fábrica de Cultura – Foto: Letícia Gomes

  “Eu acho que a gente literalmente salva vidas aqui, porque oferecemos uma opção. O que falta em algumas comunidades são opções para a galera.”, afirma Izabella Carina Xavier de Oliveira, 28, professora de Circo. Além de proporcionar a chance de conhecer uma modalidade diferente, Izabella considera que o espaço oferece aos alunos a oportunidade de fazer amigos e trabalhar em conjunto, ressaltando também a criação de vínculos. Um ponto de vista semelhante é o da professora de música, Alice Andrade,38, que destaca que para muitos alunos, a Fábrica de Cultura é o único momento de lazer da semana. “Eles trabalham a semana inteira e vêm para cá, tendo um dia dedicado a eles, para lazer e descanso”, diz Alice. Ela também ressalta que, para os aprendizes mais velhos, muitos dos quais já estão aposentados, o espaço se torna uma extensão da vida social, oferecendo atividades como aulas de música, coral, dança e até costura.

Alunos participam de aula de violão na Fábrica de Cultura Jardim São Luís – Foto: Letícia Gomes

   Segundo o Mapa da Desigualdade 2023, o Jardim São Luís ocupa a 54ª posição no indicador de Educação, referente à proporção de alunos que abandonaram a escola no Ensino Fundamental da rede municipal, com um índice de 1,25%. Para comparação, bairros como Belém e Perdizes, que apresentaram os índices mais baixos da cidade, têm índices de 0,11% e 0,18%, respectivamente. “Eles não podem frequentar aqui dentro do horário de escola deles. Então, a gente sempre pergunta”, diz Alice, explicando que, na unidade, os jovens têm ao menos um lugar seguro para estar, além da oportunidade de aprender algo novo e expandir seu repertório.

   Ela também é professora do “senhor” Givaldo Silva, 77, aposentado, que faz parte da trilha de música por lazer. Ele conta que participa das aulas para aprender a cantar um pouco para as pessoas e, quando surgir a oportunidade, tocar violão para alguém. “Eu adoro violão e a Alice é uma pessoa maravilhosa. Aí a gente se sente à vontade, se sente em casa”, diz Givaldo. Há quase oito anos, ele participa das atividades desta unidade e recorda com carinho dos professores que passaram por aqui, incluindo uma profissional que agora leciona na unidade do Capão Redondo, a única outra Fábrica de Cultura na Zona Sul de São Paulo.

   Quando chegou para trabalhar no local, o mestre de Capoeira Oscar de Carvalho,73, conhecido como “Macaco” em sua roda, já realizava atividades pela Fábrica de Cultura, mas em outros espaços. “O prédio foi construído com o propósito de acolher as crianças da comunidade, para evitar que tantos jovens fossem sepultados no cemitério ao lado”, relata o mestre. Ele explica que, há muitos anos, foi convidado a se tornar o primeiro educador de cultura popular a atuar nesse prédio e relembra: “Estamos situados dentro do cemitério, que antigamente era um lugar fechado.” Em 2008, a cidade de São Paulo enfrentava um cenário alarmante de violência, com 630 homicídios registrados no primeiro semestre, segundo as estatísticas do Governo do Estado. A Zona Sul da capital liderava as estatísticas, com 230 casos. Dentro dessa região, o chamado “Triângulo da Morte”, que abrange Capão Redondo, Jardim São Luís e Jardim Ângela, concentrava 14,5% dos homicídios da cidade, com 44 assassinatos registrados no segundo trimestre.

Aula de capoeira com participação de jovens e adultos na Fábrica de Cultura Jardim São Luís. Na imagem, o mestre Oscar “Macaco” instrui um dos alunos – Foto: Letícia Gomes

“A primeira reunião pedagógica que aconteceu na Fábrica foi nessa sala, a sala de capoeira, e foi no dia 1º de fevereiro de 2008”, afirma o mestre, apontando para o local onde estamos. Ele relembra que, naquele momento, não se sabia qual seria o futuro do projeto, pois era algo novo. De 2012 até hoje, ele é o único educador que permanece na unidade. Também participando de nossa conversa está Pedro Marcelo Oliveira Gomes, conhecido como “João de Barro”, de 16 anos e aluno de Capoeira. “A capoeira clareou minha mente e me fez pensar em outras áreas da minha vida”, afirma Pedro, que, após começar a frequentar as aulas, se interessou por estudar diversos temas, como robótica, plantas e engenharia. Ao ouvir os nomes chamados para a aula, fica ainda mais visível que estamos em uma roda de capoeira: quero-quero, sabiá, guerreiro, amora. E, em um momento, quando o professor chama por “Café”, o aluno chega logo em seguida e alguém brinca: “É expresso!”.

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