O distrito da Vila Mariana tem experimentado uma transformação significativa em sua paisagem urbana com a substituição de antigas casas pequenas, muitas vezes dentro de aconchegantes vilarejos, por modernos e altos edifícios. Essas mudanças estruturais, em grande parte, são impulsionadas pelo novo plano diretor da cidade, que permitiu o aumento no limite de altura das edificações na região. No entanto, essas alterações levantam questões preocupantes sobre o futuro do comércio local, a segurança e o bem-estar dos moradores antigos do bairro.
As mudanças já vêm sendo sentidas pela comunidade, tanto no âmbito comercial, quanto no residencial. É o que afirma Tiago Santos, comerciante de 46 anos e dono de um sacolão: “Se viessem só os prédios estaria bom. Mas surge um mercadinho daqueles (referência à cadeia de mini-supermercados Oxxo) a cada esquina. Quem era meu cliente, boa parte saiu das vilas, aí outra boa parte está indo naquele hortifrúti que abriu na Humberto I, que só veio depois desses prédios também. Infelizmente, não sei se vou poder manter o negócio para o ano que vem. Meu faturamento despencou”. Para o comerciante, essas construções, muitas vezes, substituem casas de famílias que viveram na área por gerações, transformando a paisagem e a dinâmica do bairro.
A segurança é outra questão que preocupa os moradores. O aumento da densidade populacional e o surgimento de edifícios mais altos podem sobrecarregar os serviços públicos e a infraestrutura existente. Isso levanta preocupações sobre a capacidade das autoridades em lidar com a segurança e a mobilidade na região, bem como a preservação dos espaços públicos e áreas verdes. O porteiro Valdir Silveira, idade, que trabalha há 23 anos num prédio na Rua Bagé, afirma ter observado um aumento nas ocorrências policiais: “Ultimamente, rapaz, o que tem de viatura por aí e várias vezes com sirene ligada. Eu nunca tinha pensado que era por causa desses prédios, né? Mas deve ser por isso mesmo, antes só morava as mesmas famílias por aqui, todo mundo se conhecia. Agora a ‘bandidagem’ tá solta por aí, aproveitando que ninguém se conhece mais”.
Os moradores mais antigos da Vila Mariana também expressam sua inquietação com a possibilidade de perderem o sentimento de comunidade que sempre caracterizou o bairro. A construção de prédios modernos pode atrair uma nova demografia, mudando a dinâmica social do local e afetando as relações entre vizinhos. Para Carmen Vidal, aposentada de 74 anos, a mudança é preocupante: “O meu prédio era o único que tinha aqui até 15 anos atrás. E hoje tem o meu e mais uns 5, só aqui na rua. A criançada sempre passava por aqui, andando de bicicleta, todo mundo se conhecia. Hoje eu ando na rua e não vejo mais criança, e nem rostos conhecidos. Parece que eu mudei de bairro, mas quem mudou foi o bairro.”
As alterações trazidas pelo novo plano diretor da cidade têm um profundo impacto na Vila Mariana, desde a sua estrutura física até as relações comunitárias. Existe uma resistência a ele, por conta de a ampliação das áreas destinadas à verticalização e adensamento ter implantada sem que nenhum estudo de impacto urbano ou ambiental, econômico ou de capacidade de suporte dos sistemas de transporte tenha sido realizado para justificar e calibrar essa proposta. Associações de bairro da Vila Mariana vêm fazendo contestações, especialmente por conta da pauta dos impactos ambientais. O desafio agora é encontrar um equilíbrio entre o desenvolvimento urbano e a preservação do caráter único deste local, garantindo que as mudanças estruturais não prejudiquem os moradores e comerciantes que tanto amam a região.