Quem ouve falar de São Bernardo do Campo sempre pensa ou em um deserto de fábricas automobilísticas ou no forte sindicalismo da cidade. Talvez até associe ao atual presidente da República, que iniciou seu trabalho político na região do ABC Paulista, durante as greves dos anos 1970. Poucos, porém, diriam que o Brasil teve sua “Hollywood” ali, na Companhia Cinematográfica Vera Cruz e que dali saíram filmes premiados no mundo todo, inclusive no festival de Cannes, o “Oscar” da França. – com exceção dos cinéfilos ou fãs nostálgicos dos filmes do Mazzaropi, daqueles que tiram da cartola, de repente, curiosidades dos bastidores.
O Pavilhão Vera Cruz foi fundado no dia 04 de Novembro de 1949 pelo produtor teatral Franco Zampari e o industrial Francisco Matarazzo Sobrinho em uma antiga granja de São Bernardo do Campo, sendo a terceira companhia cinematográfica criada em território nacional. O complexo que abriga até hoje dois dos maiores estúdios da América Latina teve seus tempos áureos entre 1950-1954, produzindo 22 filmes e documentários aclamados. Entre eles Caiçara, Sinhá-Moça e o Cangaceiro. Em 1972, suas atividades foram encerradas após uma série de crises financeiras. Hoje, tombado historicamente e rebatizado como Estúdios e Pavilhões de São Bernardo, os galpões são usados por uma empresa chamada PRH-9 Produções, que produz programas de entretenimento da TV BAND, como “Masterchef”.
Pensando em homenagear o solo Vera Cruz e restaurar a veia artística cinematográfica de São Bernardo do Campo, a cidade sediará o seu 1º Festival Cinematográfico: “Prepare-se para o mais aguardado e inédito Festival de Cinema do Brasil”, destaca o site oficial do evento. A primeira edição acontecerá entre os dias 28 de novembro e 02 de dezembro de 2023.
“O festival nasceu de um ideal artístico de se fazer algo que pudesse celebrar a memória do cinema brasileiro e da minha cidade. Mazzaropi, Ruth de Souza, Eliane Lage, Tônia Carrero, Anselmo Duarte, Cacilda Becker, Procópio Ferreira, Adoniran Barbosa…Enfim, valorosos artistas do teatro, do cinema e da televisão surgiram, se revelaram e se projetaram a partir daqui”. Conta Ruty Serrati, ator e idealizador do evento, natural e residente de São Bernardo do Campo.
Eliane Lage citada por Ruty é a primeira grande atriz do Pavilhão Vera Cruz e única artista viva deste período até hoje. Aos 95 anos, será homenageada na premiação que celebra o “Planalto Abençoado”, como clamava o slogan da Cia Vera Cruz, durante seu auge.
A abrangência da premiação é nacional e as inscrições foram encerradas no início de setembro. Serão contemplados filmes em diversas categorias: longa-metragem de ficção brasileiro, longa-metragem documental brasileiro, longa-metragem de animação brasileiro, curta-metragem de ficção Brasileiro, curta-metragem de ficção regional (Grande ABC), curta-metragem documental brasileiro, curta-metragem documental regional (Grande ABC), curta-metragem de animação brasileiro e curta-metragem de animação regional (Grande ABC). Dentro de cada categoria serão premiados melhor direção, roteiro, fotografia, direção de arte, ator, atriz, edição/montagem, desenho de som, figurino e caracterização.
O evento acontece no Centro de Formação de Professores de São Bernardo do Campo (CENFORPE), próximo à rodovia Anchieta, segundo o site oficial do evento e terá capacidade para 1.710 pessoas. A entrada é gratuita, mediante doação facultativa de dois quilos de alimentos não perecíveis que serão destinados ao Fundo Social de Solidariedade da Cidade.
Eliete Ramos, cineasta e arte-educadora natural de São Bernardo do Campo fala sobre a importância de um festival como esse no Município: “O Festival representa uma oportunidade de reconhecimento para os artistas locais, que têm desenvolvido trabalhos em uma ampla gama de gêneros. Além disso, é uma vitrine importante para mostrar à cidade a vasta cadeia produtiva que é impulsionada, quando projetos audiovisuais são realizados na cidade, beneficiando diversos setores como comércios, lojas, brechós e muitos outros”.
Apesar de não estar competindo nas premiações, Eliete acredita que o evento é um testemunho da continuidade do legado criativo deixado pelos Estúdios Vera Cruz.
“Precisamos lutar contra o apagamento da nossa memória cultural e do legado daqueles que nos antecederam! Viva Ruth de Souza, viva Eliane Laje e viva o cinema brasileiro!”, finaliza Rudy Serrati.