Um sorriso nordestino na Galheteria, em Moema

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Gabriel Albuquerque

Mais um dia se inicia na movimentada Avenida Cotovia, região comercial de Moema. Lugar movimentado, onde carros, motos, ônibus, caminhões de entregas  e até aviões rasgando o céu são comuns. Observei diferenças drásticas nas realidades distintas do cotidiano. De um lado os  acanhados fazem longas caminhadas sem preocupações, enquanto os feitores continuamente tinham pressa.

A diferença acabou se tornando comum no bairro e as máscaras de repulsão. É um local onde os papéis se invertem e as bestas dos medíocres, tais os que comem ração purina. Tem mais alimento e compaixão do que um sujeito sem teto.

Chegando perto do restaurante, ouvi risadas e gargalhadas. Parecia que  a energia do local renovou meu humor logo pela manhã. Um rapaz alto, com a cabeça raspada, moreno já veio logo me comprimentar, o sorriso largo era contagiante e foi então que conheci o subgerente do restaurante Galleteria Assados.

Manoel Silva, um rapaz de 47 anos, trabalhou quase a metade de sua idade no restaurante, hoje considerado um lar, onde fez suas raízes e amigos. É um baiano arretado, apelido carinhoso que ganhou de clientes e colegas. Sua jornada se iniciou aos 16 anos quando veio sozinho tentar a sorte na grande capital paulista, deixando seus pais e lar para trás.

Ele conta que nos primeiros anos se sentiu perdido e solitário. Os empregos não eram bem remunerados e as pessoas corriqueiramente cometiam xenofobia. Pensou até em voltar para a sua casa, no entanto, se juntou ao restaurante e desde então nunca mais se sentiu sozinho.

“Posso não lembrar todos os nomes dos meus clientes, mas eu guardo os rostos. A região se desenvolveu muito. Antigamente a maioria da região era cercada por casas e pequenos prédios, mas agora, condomínios grandes e prédios comerciais são feitos e isso traz pontos positivos e negativos”.

Em meio ao sotaque e as gírias nordestinas, ouço um soar de sino acompanhado com um bom dia. Ao olhar no entorno, reparei uma situação, uma voz abatida e cansada fazendo um  pedido simples.

O pedinte queria apenas um copo com água, pedido foi rapidamente atendido pelo mesmo sorriso largo, na sequência, o esmoleiro agradeceu e retribuiu com outro sorriso.

Ao ser questionado sobre o tratamento, Manoel conta que: “ se o sorriso do servidor for verdadeiro, logo o cliente o retribuirá, com outro sorriso”. Palavras tão simples e gestos tão pequenos fazem o lugar onde ele trabalha prosperar.

O lugar é muito agradável, mesas e sofás confortáveis além de um atendimento eficiente, as plantas, iluminação traz um ótimo lugar de paz em meio ao caos da cidade no lado de fora porém, as pessoas levam a vida do restaurante.

Galleteria Assados passou por momentos difíceis durante a pandemia. Muitos restaurantes familiares foram obrigados a fechar as portas. Como é um bairro nobre, a locação é uma das mais caras na cidade de São Paulo, sendo cerca de 24 mil reais o metro quadrado segundo o site da revista Exame.

Manoel comparou esse ano como a passagem da ave mitológica fênix, ave essa que pode renascer das próprias cinzas após sua morte, também nos contou que foram os clientes mais antigos, a maior força para se manterem.

A gratidão era perceptível nas falas arrastadas do baiano arretado. O lugar que ele é apaixonado. As pessoas que trabalham com ele há mais de 20 anos, deram um novo rumo pra sua vida e quando ele pensava ter acabado por conta de uma pandemia mundial, suas esperanças foram renovadas novamente pelos clientes.

O restaurante serve muito mais que frangos e carnes, servem sorrisos em um ambiente tão hostil. Essa é a magia que poucos lugares conseguiram manter e esse é o maior diferencial, a fidelidade dos clientes vem não só com a comida boa.